quarta-feira, 21 de março de 2012

Cores


O sábado nasceu lindo. Céu de almirante, nem uma nuvem
solitária a procurar companhia. Acordo bem cedo. Passeio
frugal com o Topek. Xixi e cocô. Ambos fazem os dois.
Ducha rápida, jeans e camiseta. Nao, não vou mais fazer um
treino infindável para maratonas, Não corro maratonas, corro
para manter a forma. Também ando de moto. Não corro para
manter a forma. Sou tiozinho e responsável. Engulo um suco,
coloco o casaco de couro e saio, sem antes dar um último
afago no bichinho. Vou para o sub-solo onde ela me espera.
Pronta e perfeita. Linda. Tinindo. Sento, solto algumas
palavras de carinho, coloco as luvas e a ligo. Imediatamente
ela retribui as palavras de carinho. Em alto e bom som.
Alguns diriam altíssimo som. Saio e sinto aquele friozinho
típico de uma manhã de outono. Mas com o casaco e as
luvas de couro de veado (o couro) estou protegido.
Encontro meu amigo Eduardo Di Lascio, também tiozinho.
Veja bem, para mim este impropério é um elogio. Pontual,
consciente, confiável, comportado. Este é o tiozinho, o amigo
perfeito para se andar de moto. Ou conversar sobre a vida
(acrescente "inteligente" à definição). E lá vamos nós.
Marginal Pinheiros, Tietê, estrada dos Bandeirantes.
Curvas, retas, eu e minha máquina nos tonando uma coisa só.
Difícil dizer onde acaba o piloto, onde começa a motocicleta.
Ah, a tal liberdade é isto?
Não, Liberdade é um bairro de São Paulo.
Isto é prazer e prazer é o que colore a vida.
O sábado nasceu lindo. Céu de almirante, nem uma nuvem
solitária a procurar companhia. Acordo bem tarde.
Não passeio com o Topek nem ligo minha Harley-Davidson.
O máximo de simbiose entre homem e máquina sou eu
e minha cadeira-de-rodas. A ducha não é tão rápida nem
o suco. Saio com o Arnaldo Nana Dratwa e meus sobrinhos.
Rio com eles e como algum prato delicioso em um restaurante
delicioso. Depois disto, um cineminha e depois umas visitas,
amor e mais carinho. Isto é liberdade? Não, são novos prazeres
que a vida me apresentava e agora vejo com novos olhos.
Podem ainda não ser tão coloridos, mas aos poucos
acrescento novos tons.
      

Ana Lanches


      

quinta-feira, 15 de março de 2012

terça-feira, 13 de março de 2012

quinta-feira, 8 de março de 2012

Missa a 1/2


Fui a missa de sétimo dia do amigo Francesco. Sei, estas
coisas não se bradam por aí, você apenas faz e pronto.
Mas senti necessidade de escrever e ponto. Francesco
sucumbiu à luta contra o câncer. Nos seus últimos tempos
ele falava bastante de mim a sua esposa que queria me
conhecer. Não éramos próximos. Apenas dois apaixonados
pelo mundo Harley-Davidson. Na última vez que o vi,
estava ele comandando as grelhas. Era um churrasco
na oficina de outros amantes da Harley. Lá estava ele
e sua indefectível máquina vermelha e preta. Apenas
muito, muito magro, o intrépido italiano todo alegria
e sorriso ficou mais feliz ao me ver. O amargurado aqui,
ao ver tanto bom astral emanando, ficou chateado que todos
se curavam desta doença, menos, é claro, o azaradão que
vos escreve. Envolto em minha própria batalha diária,
não mais falei com ninguém. Qual não foi minha surpresa
semana passada, quando recebi um e-mail do dono
da oficina dizendo "Hoje falei com a esposa do Francesco
e ele não está nada bem, está internado e sedado, ela
me perguntou quem é o amigo Claudinho de quem ele
tanto fala". O Claudinho que ele tanto fala ficou acabado
ao saber de seu falecimento. Como se ele estava curado?
Estava curado em minha cabeça, onde está bem quem anda
a pé ou de moto. Vaidade minha. Vaidade estúpida. Só
porque estou debilitado fisicamente não me credencia a
coitadinho do ano. Ainda estou aqui. Ainda estou lutando.
O Francesco não teve isto. Fui a missa não por vaidade
ou para te contar. Fui por vergonha, arrependimento
do pensamento errado, por descobrir que não sou o centro
do universo. Fui porque dar é melhor que receber, e queria
dar uma força à esposa do amigo. Foi assim que aprendi
mais uma lição. Francesco, descanse. Não sei ainda quando,
mas como todos vão, um dia a gente se encontra
nas estradas do céu. Alessandra, pena nos conhecermos
em um momento tão difícil. Seja forte.